Pátio da Inquisição |
As Grandes Opções do Plano (GOP) são, como o nome indica, o documento onde cada Executivo Autárquico apresenta as suas principais linhas de intervenção.
Há sempre duas maneiras de as definir – em diálogo com a oposição e com a sociedade civil ou em regime de “auto-suficiência”, apresentando o documento à última da hora, simplesmente sujeitando-o ao voto do conjunto dos vereadores.
Em relação às GOP para 2015, o actual Executivo da Câmara Municipal de Coimbra escolheu a segunda via, o que teve duas consequências: foi necessário recorrer ao voto de qualidade do Presidente para as aprovar e os seus principais destinatários – os cidadãos do concelho – só conheceram as intenções da Autarquia depois de o documento estar aprovado.
Dir-se-á que são as regras da democracia representativa. É verdade que sim, se encaradas de uma forma legalista e redutora do exercício democrático do poder.
Mas é também uma regra da democracia (e da decência) que os eleitos cumpram o que prometem em campanha. E que quando alteram os seus planos expliquem as razões de tal mudança a quem delegou neles o poder de governar.
O caso da cultura dá-nos dois graves exemplos de violação desta regra. O primeiro é a descida muito significativa do investimento nesta área – de 3,31 para 2,5% do total do Orçamento. Na cidade que se regozijou com a classificação atribuída pela UNESCO, que continua a afirmar que a cultura e o conhecimento são as suas maiores “potencialidades”, esta descida é muito significativa. Não há outra leitura possível: ao contrário da retórica de campanha e dos discursos de circunstância, foi agora oficializado que o Executivo de Manuel Machado tem como uma das suas Grandes Opções do Plano diminuir a importância da cultura no conjunto da acção da Câmara Municipal.
Este corte tem consequências concretas. Há instituições que desaparecem das GOP e que, portanto, deixarão de poder contar com o apoio da Câmara Municipal para desenvolverem as suas actividades. Duas delas são a Cena Lusófona e a Associação Encontros de Fotografia. Estou ligado à primeira (sendo portanto directamente afectado), mas não é por isso que a refiro aqui. É que tanto uma como outra são responsáveis pela gestão de equipamentos municipais – no caso da Cena Lusófona, pela Ala Central do Colégio das Artes, no Pátio da Inquisição, cuja recuperação foi financiada pela União Europeia com o fim específico de aí ser instalado o seu Centro de Documentação e Informação; no caso dos Encontros de Fotografia, pelo Centro de Artes Visuais (CAV), um equipamento de referência a vários níveis, entre os quais a colecção que alberga e o próprio projecto de arquitectura. Deixá-las de fora das GOP significa que a CMC se desinteressa pelo que acontece nestes seus espaços (onde ela própria investiu dinheiro público), o que é inaceitável.
Mais uma vez, é de assinalar a contradição com o que foi prometido aos eleitores. Não é necessário recuar muito para lembrar como os Encontros de Fotografia foram apresentados por Manuel Machado, antes e depois das eleições, como um dos principais projectos culturais para a cidade. Além disso, os Encontros e a Cena são parte essencial de um projecto iniciado há mais de uma década, com o mesmo Presidente da Câmara: a recuperação da vocação cultural do eixo Pátio da Inquisição / Rua da Sofia, que agora se arrisca a ser destruído por quem aceitou criá-lo. Não é um projecto qualquer. Trata-se da zona histórica da cidade, em pleno centro urbano e na tal zona classificada que tanto fez inchar de orgulho os nossos governantes. Se esta zona é tratada assim, o que dizer do resto do concelho?
Quando questionado sobre as razões desta inusitada inversão de rumo, o Executivo limitou-se a responder, pela voz da Vereadora da Cultura, que o mesmo acontecia à generalidade das associações. Talvez, mas os cidadãos merecem mais do que respostas do tipo “porque sim” ou “porque não”. A governação de uma cidade não pode ficar refém de supostas incompatibilidades pessoais ou das arbitrariedades de quem foi escolhido para exercer o seu mandato.
A fundamentação das decisões e a prestação de contas pelo que é feito são tão essenciais à democracia como as eleições. Neste momento, e perante o que aconteceu a propósito das GOP na cultura, é isso que Manuel Machado e a sua equipa nos devem.
Pedro Rodrigues
produtor cultural, membro da Assembleia de Freguesia de Santo António dos Olivais, eleito pelo Movimento Cidadãos por Coimbra
Há sempre duas maneiras de as definir – em diálogo com a oposição e com a sociedade civil ou em regime de “auto-suficiência”, apresentando o documento à última da hora, simplesmente sujeitando-o ao voto do conjunto dos vereadores.
Em relação às GOP para 2015, o actual Executivo da Câmara Municipal de Coimbra escolheu a segunda via, o que teve duas consequências: foi necessário recorrer ao voto de qualidade do Presidente para as aprovar e os seus principais destinatários – os cidadãos do concelho – só conheceram as intenções da Autarquia depois de o documento estar aprovado.
Dir-se-á que são as regras da democracia representativa. É verdade que sim, se encaradas de uma forma legalista e redutora do exercício democrático do poder.
Mas é também uma regra da democracia (e da decência) que os eleitos cumpram o que prometem em campanha. E que quando alteram os seus planos expliquem as razões de tal mudança a quem delegou neles o poder de governar.
O caso da cultura dá-nos dois graves exemplos de violação desta regra. O primeiro é a descida muito significativa do investimento nesta área – de 3,31 para 2,5% do total do Orçamento. Na cidade que se regozijou com a classificação atribuída pela UNESCO, que continua a afirmar que a cultura e o conhecimento são as suas maiores “potencialidades”, esta descida é muito significativa. Não há outra leitura possível: ao contrário da retórica de campanha e dos discursos de circunstância, foi agora oficializado que o Executivo de Manuel Machado tem como uma das suas Grandes Opções do Plano diminuir a importância da cultura no conjunto da acção da Câmara Municipal.
Este corte tem consequências concretas. Há instituições que desaparecem das GOP e que, portanto, deixarão de poder contar com o apoio da Câmara Municipal para desenvolverem as suas actividades. Duas delas são a Cena Lusófona e a Associação Encontros de Fotografia. Estou ligado à primeira (sendo portanto directamente afectado), mas não é por isso que a refiro aqui. É que tanto uma como outra são responsáveis pela gestão de equipamentos municipais – no caso da Cena Lusófona, pela Ala Central do Colégio das Artes, no Pátio da Inquisição, cuja recuperação foi financiada pela União Europeia com o fim específico de aí ser instalado o seu Centro de Documentação e Informação; no caso dos Encontros de Fotografia, pelo Centro de Artes Visuais (CAV), um equipamento de referência a vários níveis, entre os quais a colecção que alberga e o próprio projecto de arquitectura. Deixá-las de fora das GOP significa que a CMC se desinteressa pelo que acontece nestes seus espaços (onde ela própria investiu dinheiro público), o que é inaceitável.
Mais uma vez, é de assinalar a contradição com o que foi prometido aos eleitores. Não é necessário recuar muito para lembrar como os Encontros de Fotografia foram apresentados por Manuel Machado, antes e depois das eleições, como um dos principais projectos culturais para a cidade. Além disso, os Encontros e a Cena são parte essencial de um projecto iniciado há mais de uma década, com o mesmo Presidente da Câmara: a recuperação da vocação cultural do eixo Pátio da Inquisição / Rua da Sofia, que agora se arrisca a ser destruído por quem aceitou criá-lo. Não é um projecto qualquer. Trata-se da zona histórica da cidade, em pleno centro urbano e na tal zona classificada que tanto fez inchar de orgulho os nossos governantes. Se esta zona é tratada assim, o que dizer do resto do concelho?
Quando questionado sobre as razões desta inusitada inversão de rumo, o Executivo limitou-se a responder, pela voz da Vereadora da Cultura, que o mesmo acontecia à generalidade das associações. Talvez, mas os cidadãos merecem mais do que respostas do tipo “porque sim” ou “porque não”. A governação de uma cidade não pode ficar refém de supostas incompatibilidades pessoais ou das arbitrariedades de quem foi escolhido para exercer o seu mandato.
A fundamentação das decisões e a prestação de contas pelo que é feito são tão essenciais à democracia como as eleições. Neste momento, e perante o que aconteceu a propósito das GOP na cultura, é isso que Manuel Machado e a sua equipa nos devem.
Pedro Rodrigues
produtor cultural, membro da Assembleia de Freguesia de Santo António dos Olivais, eleito pelo Movimento Cidadãos por Coimbra