Chuck Connelly, The Broken Ark
2001, 65'' x 96'', oil on canvas
Uma boa parte do meu trabalho consiste em gerir sensibilidades. Quando uma vez me disseram que era bom no que fazia, dei-me ao luxo de ficar contente. O exercício desta função requer um conjunto de qualidades que qualquer pessoa gosta de pensar que tem: disponibilidade para ouvir os outros; capacidade de distinguir, entre aquilo que nos é dito, o essencial do acessório; inteligência na transmissão dos argumentos; intuição apurada quanto ao que os outros pensam e vão pensar. Requer, além disso, a humildade de não impor os nossos pontos de vista e de tentar contribuir para a construção de uma posição comum – entre as sensibilidades em causa, em primeiro lugar, e só eventualmente entre estas e aquilo que defendemos.
Paradoxalmente, esta função implica, por isso mesmo, uma modéstia e uma discrição que, quando bem sucedidas, nos enchem de orgulho. Podemos nem fazer mais nada de relevante, mas realizamo-nos no essencial: a ajudar a que corram bem (ou melhor) as relações humanas entre aqueles que nos rodeiam e de quem gostamos.
O pior é quando se falha. Para além dos efeitos externos – sobre o projecto, a instituição, a família ou o que quer que seja que nos une enquanto colectivo –, o insucesso atinge o mediador na sua base de apoio e atira-o ao chão, inevitavelmente. Não só ele é obrigado a concluir que não possui nenhuma das qualidades que desejava ter como descobre um conjunto de defeitos adicionais com que terá de aprender a lidar. À cabeça, a arrogância de ter pensado que era mais sensato, prudente, clarividente, racional que as partes que se propôs conciliar. Mas também o facto de, tão concentrado que estava em aproximar as sensibilidades dos outros, ter afinal abdicado de aprofundar a sua própria posição.
Tê-lo-á feito por uma boa causa, é certo, mas agora sente a falta de a que se agarrar. As bóias que ofereceu aos seus amigos náufragos estavam sem dúvida furadas e para si não sobrou nenhuma.
Dizia o outro: “try again, fail better”.
Certo. Vejamos então se ainda sei nadar.
1 comentário:
tenho a certeza que sim! adorei as palavras, a sinceridade e a harmonia na linha de construção do pensamento.
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