António Lobo Antunes, D'este viver aqui neste papel descripto.
Cartas da guerra. Lisboa, Dom Quixote, 2005.
Cartas da guerra. Lisboa, Dom Quixote, 2005.
Dizem-me que através das cartas (como de resto dos diários) se conhece melhor a pessoa que há por detrás do seu autor. Que nelas se abstém este de colocar os pós literários que distribui por outros géneros e que assim se expõe, indefeso, à curiosidade dos leitores.
Tentadora, porém pura, ilusão - parece-me. Para além de mais amarradas ao tempo e ao espaço em que foram escritas, elas oferecem-se-nos num código partilhado apenas pelos seus destinatários originais. Disfarçado de transparência, é este código não mais do que campo para especulações de terceiros sobre os reais sentimentos, razões e intenções de quem escreve. Ei-lo, pois, medricas corajoso ordinário apaixonado cavalheiro vaidoso arrogante céptico inseguro humilde inquieto brilhante solidário solitário revolucionário reaccionário, ei-lo tudo o que quisermos.
Desconhecedores desse código, ficamo-nos pela superfície das palavras que lemos, encarregues nós mesmos de esculpir os seus relevos. Ficamo-nos pela literatura.
E ainda bem.
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