25 de agosto de 2006

xiii

- Isto vai demorar.

chegado de Algés e nem tempo para uma cerveja, logo um pintas de malas aviadas

- Para o aeroporto, se faz favor.

A apetecer-lhe mandar-me à merda, pressinto-o na impaciência com que vai dedilhando o volante, o vidro, a manette das mudanças, logo um pintas de malas aviadas a propor-lhe um serviço que nem dá para o gasóleo. O verde a cair, ganha balanço e alivia o semblante, é a vida, antes isto que um preto a espetar-me uma faca, há-de pensar, e eu consolo-me por não ser preto e pelo alívio que apesar de tudo isso lhe há-de proporcionar.

- Isto é que está um trânsito,

digo, com um

- hã?

esperançado no final da frase para quebrar o gelo, a ver-lhe os olhos irónicos emoldurados pelo crucifixo a fitar-me antes de corresponder

- É verdade, a esta hora
- Já se sabe

Os dois em coro e uma nova pausa, os dois a sabermos que agora é do tempo, falas tu ou falo eu

- E este calor

Foi ele, a duplicar a jogada, eu finjo que não noto e avanço com o cavalo

- Está demais. Uma chuvinha não calhava nada mal.
- Está bom é para quem está na praia.

Ele a arriscar, a abrir o jogo, o bispo numa diagonal temerária. Reservo o ataque para mais tarde e continuo a organizar-me, um peão cauteloso

- É, mas para quem cá está a trabalhar é dificil.

Mas ele desabrido, ao quinto semáforo e a rotunda ainda longe, a torre por ali fora

- Isto quem quer trabalhar, trabalha de qualquer maneira. Agora esses calões que para aí andam
Eu a ver o caso mal-parado, ainda nem sequer saímos da avenida, melhor recuar o cavalo

- Pois é, lá isso.

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